Uma das grandes novidades no mundo jurídico contemporâneo diz respeito a possibilidade de aplicação do Seguro Garantia Judicial em execuções fiscais, como alternativa colocada à disposição do devedor em potencial. O seguro garantia consiste em um negócio jurídico pelo qual as partes se obrigam a cumprir determinada obrigação.

Para entender melhor a aplicabilidade desse instituo nas execuções fiscais, essencial que se aborde, primeiramente, o conceito de execução fiscal. Em linhas gerais, o processo de execução é marcado pela vontade de um agente, o credor, de ter suas obrigações satisfeitas por parte do devedor. A execução é o meio adequado para, coercitivamente, obrigar o devedor a arcar com suas obrigações.

O processo de execução fiscal, por ser mais específico do que a execução em geral, segue regras específicas. O credor se confunde na figura do Estado, que demanda o devedor, cidadão, a cumprir com uma obrigação de cunho fiscal e tributário. Trata-se, pois, de espécie de execução de título extrajudicial, regulamentada pelo direito brasileiro.

Através da execução fiscal, União, Estados, Distrito Federal e Municípios podem fazer valer suas prerrogativas, obrigando os devedores a cumprir suas obrigações perante cada um desses entes federados. A execução fiscal é baseada em dívida certa e líquida, exigida em juízo. O documento que comprova a obrigação é a certidão de dívida líquida.

O Código de Processo Civil brasileiro oferece balizas gerais para a execução fiscal, ficando a cargo da Lei das Execuções Fiscais (Lei nº 6.830/80) tratar das especificidades do procedimento de execução. Dessa forma, a execução fiscal segue o princípio da especificidade, uma vez existente norma própria para regulamentar a matéria.

A importância do Seguro Garantia Judicial reside na fase inicial do processo de execução, tendo em vista que logo que ocorra a citação, o devedor demandado tem o prazo de cinco dias para pagar o débito objeto de discussão ou garantir o pagamento através de calção. A garantia prestada pelo devedor tem várias nuances, já que ao mesmo tempo em que assegura ao credor que a dívida será satisfeita, permite que o devedor exerça seu direito de defesa.

Dessa forma, garantir o juízo nas execuções fiscais é fundamental para que o demandado consiga se defender de forma adequada, podendo até mesmo reverter a situação. O meio adequado para que o devedor possa se defender é através dos embargos à execução, cujo pressuposto é a prévia garantia do juízo.

O Seguro Garantia Judicial como caução nas execuções fiscais

Quando um dos entes federados (União, Estados, Municípios e DF) demandam um cidadão em juízo, pleiteando a satisfação de um crédito de natureza fiscal, com base em título de dívida ativa, o devedor, para exercer a sua defesa, deve caucionar o juízo. Isso significa submeter parte do seu patrimônio em juízo, demonstrando, dessa forma, a sua capacidade de suportar a dívida.

O Seguro Garantia Judicial surge, no cenário brasileiro, como uma das opções colocadas à disposição do devedor para garantir o juízo. Dessa forma, o devedor não mais fica restrito ao depósito em dinheiro ou à constrição patrimonial, podendo também apresentar em juízo uma apólice de seguro através do qual faz prova da sua capacidade de arcar com a obrigação caso seja vencido na demanda.

Existem várias vantagens para o devedor de se valer do Seguro Garantia Judicial, conforme será abordado em momento oportuno deste artigo. Primeiro, importante contextualizar a aplicação desse instituto nas execuções fiscais, explicitando o seu fundamento, características e forma legal.

O que é o Seguro Garantia Judicial e como se aplica à execução fiscal

O Seguro Garantia nada mais é do que um negócio jurídico realizado pelo devedor, incluindo também a pessoa do credor, que no caso das execuções fiscais é um dos entes federados, o próprio juízo e o garantidor, empresa que se obriga a cumprir a obrigação prevista na apólice caso o resultado seja desfavorável para o tomador do serviço.

O Seguro Garantia Judicial nas ações de execução fiscal é regulamentado pela Superintendência de Seguros Privados (SUSEP). Tal seguro pode ser aplicado em âmbito público ou privado, sendo que a diferença fundamental diz respeito à natureza do crédito que se pretende garantir. Quando em sua natureza privada, o Seguro Garantia visa caucionar uma obrigação decorrente de negócio jurídico privado, entre particulares, ao passo que em sua natureza pública o seguro está relacionado a uma dívida fiscal consubstanciada, via de regra, em dívida ativa.

De acordo com Guilherme Silveira, diretor da Genebra Seguros, pode-se dizer que existem três sujeitos na relação contratual do Seguro Garantia: tomador, segurado e garantidor. O tomador, que é “a pessoa física ou jurídica que contrata o seguro junto à Seguradora para garantir ao Segurado o cumprimento das obrigações assumidas, seja em processos de execução, trabalhistas, tributários, cíveis, cautelares, etc. É o responsável pelo pagamento do prêmio (custo do seguro) ”.

O segurado, por sua vez, “é o potencial credor da obrigação, ou seja, a pessoa física ou jurídica, empresa ou órgão público que detêm potencial direito sobre o Tomador. O Segurado é o beneficiário da apólice”. Por fim, o segurador, que se materializa na figura da empresa que emite as apólices de seguro e se compromete em fazer valer a obrigação perante o segurado.[1]

Contexto de aplicação do Seguro Garantia Judicial na execução fiscal

Nem sempre o Direito brasileiro foi aberto à possibilidade de o devedor caucionar o juízo através de uma apólice de seguro. A prática só se tornou corriqueira no seio dos processos judiciais a partir do ano de 2003, com a edição da circular da SUSEP nº 232. Tal documento regulamentou o seguro garantia judicial, o que potencializou sua utilização pelos devedores demandados em juízo. Vale mencionar que o Seguro Garantia Judicial é utilizado, nos dias atuais, em diversas esferas, mas principalmente nos processos de natureza trabalhista.

Apesar da sua regulamentação pela circular em 2003, o seguro só passou a ser aceito de forma incontroversa pela doutrina e jurisprudência nos últimos anos, com a regulamentação pelo CPC anterior, de 2006. Na redação do Novo Código de Processo Civil, já em vigência, é clara a possibilidade de substituição da penhora pelo Seguro Garantia Judicial.

O § 2º do art. 835 do CPC determina que “Para fins de substituição da penhora, equiparam-se a dinheiro a fiança bancária e o seguro garantia judicial, desde que em valor não inferior ao do débito constante da inicial, acrescido de trinta por cento”. Pela redação, é facultado ao devedor demandado caucionar o juízo através de uma apólice de seguro, apesar da Lei determinar que o valor, nesses casos, deve ser superior em 30% ao montante devido.

Como abordado anteriormente, a execução fiscal segue regras específicas, de modo que se torna imperioso analisar como o Seguro Garantia Judicial está regulamentado na Lei de Execuções Fiscais (LEF). O art. 9º da Lei nº 6.830/1980 elenca todas as garantias válidas em juízo. Até 2014, a LEF mencionava que o devedor poderia caucionar o juízo através do depósito judicial em dinheiro, da fiança bancária e da nomeação de bens à penhora, nada dispondo acerca do Seguro Garantia.

Sobre o silêncio da Lei, o Superior Tribunal de Justiça se manifestou, com posicionamento firme no sentido de que, por ser a LEF especial, deveria prevalecer sobre o que dispunha o Código de Processo Civil da época. Depreende-se do posicionamento dos ministros do STJ a clara defesa do princípio da especialidade, de modo que pela visão dessa corte, tal seguro não poderia ser utilizado pelo devedor de obrigação fiscal.

Vejamos o entendimento do STJ sobre a matéria:

TRIBUTÁRIO – CAUÇÃO – SEGURO-GARANTIA JUDICIAL – FALTA DE PREVISÃO NA LEI DE EXECUÇÕES FISCAIS – INADMISSIBILIDADE.

  1. Por ausência de previsão na Lei de Execuções Fiscais, a jurisprudência desta Corte não admite o seguro-garantia judicial como modalidade de caução da execução fiscal.
  2. Recurso especial provido.

(Superior Tribunal de Justiça. REsp 1215750 / RS – Relator(a): Ministra ELIANA CALMON; Julgamento: 14/05/2013; Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA; DJe 20/05/2013).

Em defesa do Seguro Garantia Judicial

Apesar do posicionamento do STJ em 2013, os defensores do Seguro Garantia levavam em conta a sistemática do direito brasileiro, entendendo que a aplicação de tal seguro nas execuções fiscais não apenas era possível, como também interessante para todos os envolvidos no processo. É que através do Seguro, tanto executado quando executante conseguem resultados positivos.

Os custos para o executado, ao se valer do Seguro Garantia Judicial em substituição à penhora são relativamente mais baixos. Muitos devedores, quando são surpreendidos com a execução fiscal, não tem a menor condição de retirar fundos de seu patrimônio para garantir o juízo. Sem contar no desequilíbrio financeiro gerado por tal movimentação.

Se por um lado, na relação processual da execução fiscal, tem-se a figura do credor (ente federado), que deseja receber o crédito da obrigação, figura igualmente importante é a do devedor, que não pode ser onerado excessivamente, sob pena de desvirtuamento dos objetivos da jurisdição fiscal. O Seguro Garantia Judicial é um dos mecanismos que melhor atendem aos interesses tanto do devedor quanto do credor.

Sendo modalidade de contrato, o Seguro Garantia Judicial possui, em termos práticos, o mesmo efeito do depósito em dinheiro e da fiança bancária, mas com muito menos custo para o executado. Percebe-se que, data vênia, o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça em 2013 não levou em consideração a sistemática do Direito brasileiro. Tal posicionamento, felizmente, foi superado nos anos seguintes, seja pelo esforço da doutrina, seja pela alteração na Lei de Execuções Fiscais em 2014.

A Lei nº 13.043 de 2014 e o Seguro Garantia Judicial nas execuções fiscais

Era evidente a aplicabilidade do Seguro Garantia nas execuções fiscais, o que só se tornou pacífico nos tribunais com a inclusão expressa de tal modalidade de caução na Lei de Execuções Fiscais. A Lei nº 13.043, em seu artigo novo, passou a incluir tal modalidade de caução no inciso dois:

Art. 9º – Em garantia da execução, pelo valor da dívida, juros e multa de mora e encargos indicados na Certidão de Dívida Ativa, o executado poderá (…)

II – oferecer fiança bancária ou seguro garantia;

[…]

Fato é que mesmo antes da inclusão do Seguro Garantia Judicial no rol das cauções a serem oferecidas pelo devedor, a doutrina já considerava possível tal procedimento, tendo em vista a aplicabilidade subsidiária do CPC naquilo que não fosse incompatível com a Lei de Execuções Fiscais.

Seguro Garantia Judicial nas execuções fiscais: considerações finais

Apesar da Lei estabelecer que o Seguro Garantia deve ser em valor 30% superior ao montante da dívida, tal instituto continua sendo interessante para o devedor, tendo em vista que não é preciso, de forma imediata, abrir mão de bens ou valores. Outro ponto fundamental é que o rendimento dos valores submetidos ao depósito judicial é baixo, o que sempre acarreta prejuízos para o devedor.

O advogado, nas execuções fiscais, ganhou papel mais ativo. Conforme analisa Fernando Martines, “o advogado não pode ser apenas a fonte de solução de problemas jurídicos de seu cliente: sua atuação deve ser também uma forma de auxiliá-lo a conduzir seu negócio, economizar e gerar lucro”. Dessa forma, pode o advogado orientar seu cliente das vantagens.

Outro ponto importante a ser mencionado é a velocidade com que o Seguro Garantia Judicial está se espalhando. É cada vez maior o número de pessoas que, nas execuções fiscais, preferem essa modalidade de caução. De acordo com João Girolamo, “a velocidade de crescimento do seguro garantia judicial no curto período de uma década de existência revela o seu potencial”.[2]

A regulamentação do Seguro Garantia foi de extrema importância para a propagação do instituto. “A interpretação contida nos preceitos trazidos pelo novo Código de Processo Civil (CPC/2015) indica importante evolução no que diz respeito às garantias da Execução Fiscal, e, ainda, na configuração de um processo mais efetivo e justo. ”[3]

Espera-se, agora, que cada vez mais pessoas e empresas se utilizem do Seguro Garantia em processos judiciais, sejam eles trabalhistas ou em desse de execução fiscal. Empresas como a JMalucelli Seguradora, pioneira no mercado de Seguro Garantia, estão se esforçando cada vez mais para possibilitar que todas as pessoas conheçam e descubram as vantagens do Seguro.

Autor: Valter Junior

[1] Genebra Seguros. Seguro Garantia Judicial. Disponível em: <https://www.genebraseguros.com.br/linhas-financeiras/seguro-garantia/seguro-garantia-judicial/>. Acesso em: 29 set.2017.

[2] GIROLAMO, João. Seguro garantia judicial avança, apesar da resistência da Justiça. Disponível em: <http://cadernosdeseguro.funenseg.org.br/pdf/177girolamo.pdf>. Acesso em: 29 set.2017.

[3] ROSA, Íris Vânia Santos. Penhora na execução fiscal e o novo CPC: equiparação de dinheiro à carta fiança/seguro garantia judicial, regras de substituição e regime de indisponibilidade de bens. Disponível em: <http://www.ibet.com.br/ibet-antigo/wp-content/uploads/2016/08/%C3%8Dris-V%C3%A2nia-Santos-Rosa.pdf>. Acesso em: 30 set.2017.